sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Beco

Originalmente publicado em 25 de abril de 2011.



…apagou o cigarro no cinzeiro. Quase não precisou de esforço. Ele já estava sentindo o cheiro do filtro queimado. Mas depois de doses severas de álcool, tudo o que se faz precisa de algum esforço.
E quase queima os dedos também. Não conseguia tirar uma certa preocupação da cabeça. O que era mesmo? Deixa pra lá. De alguma forma, conseguiu se livrar dela. Pagou a conta e saiu do bar.
Circulou a quadra, acendeu outro cigarro. Veio a náusea. Começou a vomitar ali mesmo na calçada, enquanto as pessoas desviavam dele. Mal conseguia erguer a cabeça. Era uma noite fria, mas as orelhas estavam em chamas. Viu uma criança olhar para ele com cara de assustada. Merda. Sentiu-se péssimo com aquilo. Resolveu se esconder no beco enquanto não passava o mal-estar.
Praticamente deitou-se no lado de um latão de lixo, e ali ficou. Não tinha forças para se erguer, e apesar de estar em um lugar pouco amigável, sentiu-se confortável por ali. Bem melhor do que estava dentro do bar.
Percebeu que ainda estava com a garrafa nas mãos. Caralho, bebendo daquele jeito. E por quê? Lembrou-se. Mas não tinha mais remédio. “O que não tem remédio, remediado está”. Tomou mais um gole, depois outro, e cochilou. No meio do sono, ouvia algumas vozes, mas continuou repousado – ou fingindo que estava. Ouviu mais murmúrios, um pouco mais alto – sinal que estavam se aproximando. Ficou onde estava. Agora sentia-se um coitado, queria um pouco de atenção. Queria que alguém sentisse pena dele, que perguntassem o que estava imcomodando-o. Queria que preparassem um chá. Isso, um chá. Ou um café, tanto faz.
- Tá tudo bem com você?
Tentou erguer a cabeça, mas não conseguiu: ela pendeu para o lado, enquanto tentava olhar para quem estava falando com ele. Inútil.
- Quero um chá.
Conseguiu contar dois golpes antes de apagar. Não sabia dizer quanto tempo ficou por ali, acordou com a boca cheia de sangue e sem a carteira, a camisa e a jaqueta. E bêbado: reparou que não amanhecera ainda. Curiosamente, a garrafa e os cigarros ficaram com ele. Menos mal. Levantou se escorando pela parede, fazendo um esforço tremendo para não cair de lado durante o processo. Acendeu um cigarro e deu um gole na bebida. Ela desceu com gosto de ferro. reparou no cigarro: estava quase apagado com o sangue que escorria da boca. Mas tudo bem, sem estresse. Existia gente em situação pior que a dele. “Tem gente por aí sofrendo de amor”. E sorriu.
De repente, o sorriso fechou-se, como que por encanto. Conseguiu lembrar porque ainda estava bebendo.
E naquele exato momento, nem pra mais nem pra menos, sentiu-se o mais infeliz dos homens.

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